terça-feira, 11 de março de 2014

A atualidade de uma reflexão...

Diogo de Macedo escreveu estas palavrinhas em 1939... É incrível perceber que nos assentam que nem uma luva:


"Casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão". O nosso povo arranjou este adágio, que eu sinto ganas de alterar dizendo com a mesma verdade: - "e todos têm razão". (...) Falta-nos a todos uma fé superior: - fé em nós próprios; fé na nossa arte; fé num ideal qualquer que nos guie acima dos mesquinhos interesses materiais; fé no nosso semelhante; fé naqueles que nos falam em fé; fé no Presente e fé no Futuro; fé, finalmente, nas coisas mais sagradas que honram o Passado, e este nos devia impor para o merecermos e nos impormos a nós próprios, com honra e orgulho. Além da Fé, falta-nos consequentemente o Amor: - amor à beleza; amor ao trabalho; amor ao espírito que ilumine o nosso próprio; amor à Vida, amor à Fé e amor à Arte. Depois da Fé e do Amor falta-nos a terceira farinha de que se compõe o pão dos artistas: - o estímulo justo das colaborações materiais, que nos leve  abençoar determinados sacrifícios; a criar uma obra valorosa; a pleitear conscienciosamente pelos prémios da permanente maratona que é a ambição na arte; a solenizar os acordos entre a ilusão e a realidade; e darmos graças a Deus pelas graças com que nos dotou, e a darmos graças aos homens pela liberdade e pela compreensão dos seus deveres, com que ajudaram a realização da nossa obra, que passa a ser deles também, porque foi inspirada numa verdade comum; e a rezarmos, enfim, ao pão que adoramos e comemos, sem razão, portanto, para ralhos, mas com razão para audaciosas conquistas, deslumbrados com o sonho de insatisfeitas Descobertas. A falta deste pão que dá razão aos queixumes de todos e desânimos a muitos, foi, em parte, motivada na descrença criminosa que nos incutiram no sangue até nos matarem o Ideal. Nós não acreditamos em nada que mereça um feliz sacrifício. Não cremos na poesia, não cremos no céu, não cremos em nós. Vivemos à dentada, traficando, odiando, prostituindo-nos. E como não cremos e só lutamos pelos sentidos baixos, não sabemos cantar, nem ser generosos, nem ser alegres. Troçamos das preces, tememos os mistérios, choramos o nosso fado. Os artistas continuam a ser artistas, não por um benefício divino, mas sim como uma punição do destino.(...)”


Diogo de Macedo - Notas de Arte: Fé, Esperança, Caridade. In Revista Ocidente, Fev. 1939.


Diogo de Macedo - L'Adieu, 1920.




"Para tudo há um momento e um tempo para cada coisa que se deseja debaixo do céu: tempo para nascer e tempo para morrer, tempo para plantar e tempo para arrancar o que se plantou, tempo para matar e tempo para curar, tempo para destruir e tempo para edificar, tempo para chorar e tempo para rir, tempo para se lamentar e tempo para dançar, tempo para atirar pedras e tempo para as juntar, tempo para abraçar e tempo para evitar o abraço, tempo para procurar e tempo para perder, tempo para guardar e tempo para atirar fora, tempo para rasgar e tempo para coser, tempo para calar e tempo para falar, tempo para amar e tempo para odiar, tempo para guerra e para paz." 
Ecl 3, 1-8